Uma onda de intoxicações e mortes recentes acendeu um alerta vermelho em todo o Brasil, expondo
uma realidade alarmante e muitas vezes invisível: a adulteração de bebidas alcoólicas. O que para muitos é um momento de lazer e socialização, para outros tem se tornado um pesadelo com consequências devastadoras, incluindo cegueira e morte.
Este artigo aprofunda a complexa teia que envolve a falsificação de bebidas no país, desde o drama humano das vítimas até os esquemas bilionários do crime organizado, e oferece orientações cruciais para que a população possa se proteger.
O Rosto Humano da Tragédia: Intoxicação por Metanol
O perigo mais letal da adulteração de bebidas é a adição de metanol, um tipo de álcool
industrial altamente tóxico. A sua ingestão, mesmo em pequenas doses, pode ser fatal. O
drama vivido pela designer de interiores Radharani Domingos, de anos, ilustra a
gravidade da situação. Após consumir três caipirinhas em um bar de uma área nobre de
São Paulo, ela teve convulsões, precisou ser intubada e perdeu a visão. "Não estou
enxergando nada", relatou em entrevista
. O caso de Radharani, infelizmente, não é
isolado e se soma a dezenas de outras notificações que sobrecarregam o sistema de saúde.
Os sintomas da intoxicação por metanol são traiçoeiros e evoluem rapidamente, conforme
detalhado por especialistas. O que começa com um mal-estar semelhante a uma ressaca
comum pode evoluir para um quadro crítico em questão de horas.
Estágio Período Sintomas e Efeitos
Inicial
Primeiras 12 horas Náuseas, dor abdominal, tontura, dor de cabeça. O fígado começa a converter metanol em formaldeído e ácido fórmico. Intermediário
12 a 24 horas Visão turva, sensibilidade à luz, acidose metabólica, confusão mental e respiração acelerada.
Avançado
24 a 48 horas Risco de cegueira irreversível, convulsões, coma, falência múltipla de órgãos e morte.
um Problema de Saúde Pública
Os números recentes revelam a dimensão da crise. Até o início de outubro de 2025 , o
Ministério da Saúde já havia registrado 59 notificações de suspeita de intoxicação por
metanol em todo o país, com a maioria dos casos concentrados em São Paulo . Em
resposta, o governo federal instalou uma Sala de Situação para monitorar a crise e
anunciou a distribuição de etanol farmacêutico, um dos antídotos usados no tratamento,
além da tentativa de importação emergencial do fomepizol, medicamento mais específico
e que não possui registro no Brasil.
O Esquema do Crime: Como Funciona a Fraude
A adulteração de bebidas é um negócio altamente lucrativo e, em muitos casos, controlado
por facções criminosas. A Polícia Federal investiga a possível ligação do Primeiro
Comando da Capital (PCC) com a onda de intoxicações, suspeitando que o metanol
utilizado possa ser o mesmo que a facção importa ilegalmente para adulterar combustíveis
.
O esquema vai desde pequenas operações clandestinas até redes sofisticadas que
reaproveitam garrafas de marcas famosas, preenchendo-as com bebidas baratas e
adicionando substâncias tóxicas. A polícia tem desmantelado diversas "fábricas" ilegais,
apreendendo milhares de garrafas, rótulos e lacres falsificados.
O Rastro do Dinheiro: Um Negócio Bilionário
O mercado ilegal de bebidas movimenta cifras astronômicas. Estima-se que o faturamento
dos grupos criminosos envolvidos na produção clandestina chegue a R$62 bilhões anuais . O setor de bebidas é, de longe, o mais afetado pela pirataria no Brasil, com um prejuízo
estimado em R$86 bilhões em .
Especialistas apontam que a desativação do Sistema de Controle de Produção de
Bebidas (Sicobe) em foi um fator crucial para a explosão do mercado ilegal.
O
sistema, que rastreava a produção em tempo real, teria gerado perdas tributárias de R$ 72 bilhões em . Sem uma fiscalização efetiva, o setor se tornou um campo fértil para a
sonegação, o contrabando e a falsificação, financiando outras atividades do crime
organizado.
Alerta Global: O Mundo de Olho no Brasil
A crise já ultrapassou as fronteiras nacionais. O governo da Austrália, por meio de seu
portal de viagens Smartraveller, emitiu um alerta para seus cidadãos, recomendando "alto
grau de cautela" no Brasil e mencionando explicitamente o risco de envenenamento por
metanol em bebidas alcoólicas
Como se Proteger: Dicas para um Consumo Seguro
Diante de um cenário tão perigoso, a prevenção é a melhor arma. A Associação Brasileira de
Bares e Restaurantes (Abrasel) e outras entidades divulgaram uma série de recomendações
para os consumidores:
• Desconfie de preços muito baixos:
Ofertas muito vantajosas podem ser um indicativo
de produto ilegal.
• Verifique a embalagem: Preste atenção a lacres, rótulos e selos fiscais.
Qualquer sinal
de violação ou má qualidade da embalagem é suspeito.
• Compre de fontes confiáveis: Dê preferência a supermercados, distribuidores e
estabelecimentos de renome.
• Exija nota fiscal: O documento comprova a origem legal do produto.
• Em bares, observe a preparação: Se possível, peça para que a bebida seja aberta na
sua frente.
Conclusão
A adulteração de bebidas no Brasil é uma crise complexa que une saúde pública, segurança
e economia. O combate a esse crime exige uma ação coordenada e enérgica do poder
público, com o restabelecimento de sistemas de rastreamento eficazes e uma fiscalização
mais rigorosa.
Para o cidadão, a conscientização e a cautela são essenciais. A escolha de
onde e o que consumir nunca foi tão importante. A vida e a saúde podem depender disso.
Referências. globo.com www.gov.br/saude/pt-br/
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