Esta é uma carta que apareceu originalmente na publicação "News of the World: The Newsletter for Queen Fans". Nela Brian tenta responder se o Queen “desistiu” dos fãs americanos após a turnê de 1982, do álbum Hot Space, que não conseguiu alcançar um disco de ouro. Ele está se dirigindo ao editor do boletim informativo, Cola Todd.
26 de março de 1997
"Caro Cola:
Agora eu gostaria de responder à sua Grande Questão.
Os Estados Unidos eram nosso maior orgulho enquanto crescíamos como banda. Ao longo dos anos 70, trabalhamos muito, fazendo turnês por muitos meses todos os anos, e grande parte desse tempo era passado nos Estados Unidos. Acho que nos orgulhamos do fato de que toda vez que voltávamos, geralmente com outro álbum nas lojas, a resposta (positiva) era cada vez maior. Sentimos que estávamos ganhando nossas asas, por assim dizer, e que o que tínhamos era um verdadeiro boca-a-boca, baseado na singularidade dos shows do Queen etc. Também dedicamos tempo ao rádio quando estávamos de passagem, principalmente Roger e eu, para que houvesse uma conexão
direta contínua entre nós e o público.
Até onde sei, uma série de coisas aconteceram com a última turnê do Queen nos EUA:
1) O álbum Hot Space foi percebido pela rádios como o Queen abandonando o Rock and Roll e trocando pela Disco - nosso timing foi talvez um pouco prematuro, o que ficou evidente quando você compara com o material que Michael Jackson faria com Eddie Van Halen e Slash nos anos seguintes.
2) Não houve um cuidado em termos de relacionamento com as rádios - tínhamos um novo encarregado da promoção que, não sabíamos na época, era muito autoritário e rude com o pessoal da mídia e deu a impressão de que nós não nos importávamos mais. Só descobrimos a grande extensão do dano muito mais tarde, ao se tentar fazer o disco solo de Freddie ser tocado. Havia um grande ressentimento (o pessoal do rádio, como todos nós, precisa se sentir amado e importante!), e o boca-a-boca durante nossa turnê foi distorcido por pessoas que agora queriam nos ver fracassar.
3) Fomos pegos no fogo cruzado de uma tentativa da Capital Records de se retirar do Independent Promotion Circus (conhecido como Payola), que dominava as execuções nas rádios da época. A Capital dispensou o homem que era o ponto central de sua conexão com a rede de propina que rolava nas estações de rádio e, na semana seguinte, 95% das estações de rádio abandonaram nosso single, Radio Ga Ga. Você pode verificar isso nos livros de registro. Havia também os boatos bem convenientes de que a letra da música era humilhante para os programadores de rádio, então havia uma boa desculpa disponível. A Capital havia sido transformada em exemplo, por aqueles que estavam no controle, e nós éramos o instrumento.
4) Fizemos um vídeo vestidos de mulher, numa paródia de uma novela, que foi visto como muito engraçado, e algo inovador, na Europa, mas para a mídia dos EUA, foi visto como uma ameaça à Moralidade. Sim, é sério - eu estava por perto e vi a reação do pessoal da TV em primeira mão - eles ficaram horrorizados! Novamente, alguns dos meios de comunicação estavam procurando combustível para o fogo do ódio (ou pelo menos da desconfiança!), e um tom homofóbico que minou ainda mais a imagem do Queen nos EUA. O resto do mundo não pareceu achar isso um problema. O que nos leva a:
5) Quando a questão da turnê surgiu, sempre olhamos as reações ao nosso último álbum ao redor do mundo. Houve uma explosão de interesse massiva na maioria dos países da América do Sul, na África, no Leste Europeu, e em parte da Europa Ocidental que havia sido mais lenta nos primeiros anos, enquanto desfrutávamos de grande reconhecimento
na América do Norte. Fazia sentido (e era divertido!) sair em turnê nos países onde havia esse crescimento e até histeria, ao invés de perder tempo nos Estados Unidos, onde sentíamos que havia uma maré de algo que, para nossos interesses e propósitos, não era diferente do Macarthismo que expulsou os artistas da geração anterior. E havia
uma teimosia de Freddie, é preciso dizer, que estava determinado a não voltar a lugar nenhum onde fôssemos MENORES do que éramos antes. Tendo visitado estádios de futebol na maior parte do mundo civilizado, teria sido deprimente voltar para os EUA e fazer teatros - ou pelo menos Freddie tinha certeza de que seria assim. Para ser honesto, sem essa exigência provavelmente teríamos engolido nosso orgulho e voltado,
como Elton fez, e com respeito de novo. Mas, na ocasião, a decisão foi esperar. Por um renascimento que nunca aconteceu.
Acho que eu estava ansioso para mostrar meus sentimentos anos mais tarde; minha fé cega em fazer turnê com a minha própria 'Brian May Band' nos Estados Unidos foi uma boa reafirmação de que temos fãs leais e grandes amigos, mas uma demonstração desastrosa de quão pouco a palavra se espalhou e de como-perder-muito-dinheiro-muito-rápido! Também foi muito difícil para mim manter o moral da minha banda, fazendo um show projetado para arenas de tamanho razoável mas para o público de clubes pequenos.
Como você pode ver, não desistimos realmente dos EUA sem lutar - apenas adiamos, na esperança de que chegasse o Momento Certo. Certamente sonhamos, com a qualidade do 'Made in Heaven' sendo tão aclamada e as vendas em todo o mundo tão fenomenais, que a América "responderia" após a morte de Freddie, se não antes. Mas não era para ser. Acho que simplesmente não jogamos como deveríamos. Ou talvez isso esteja no Futuro...! Mas eu duvido. A música se torna uma grande parte da vida afetiva das pessoas, mas sempre quando está nos ouvidos das pessoas em vários lugares. Uma grande parte da música do Queen tocou de Budapeste a Buenos Aires e Pequim, mas houve silêncio na América. Isso nunca pode ser mudado.
Mas existem pessoas como vocês que nos apoiaram independentemente disso, e tudo o que posso dizer é "Obrigado pessoal!"
- Brian May"
Trazendo para os dias atuais, é mais que compreensível a enorme satisfação de Brian (e Roger) ao ver o sucesso do filme Bohemian Rhapsody no mundo todo - incluindo os Estados Unidos - e o legado do Queen sendo festejado novamente. Totalmente merecido!
Texto original fórum Queenzone
📸 A banda numa tarde de autógrafos em Nova York, promovendo o Hot Space, em 1982.
(Lu)
